para ler ouvindo “casa no campo- elis regina"
byung chul-han cravou, se o século passado víviamos na beirada de um caos biológico, agora vivemos à beira de um caos psicólogico. claro que ele não está totalmente certo, o risco biológico grave ainda é iminente, consequência da crise climática em que vivemos.
acho que esta foi uma péssima maneira de começar esse texto, com uma introdução que não faz sentido, ao menos não de início, com o que eu realmente quero dizer. enfim.
em um intervalo meio curto de tempo, digamos alguns dias, acabei me deparando com alguns textos, conteúdos e afins que falam sobre a vida. sobre a ansiedade que é viver hoje em dia, uma necessidade extrema de estar muito presente ao mesmo tempo que tem que pensar no futuro, uma necessidade extrema de fazer que cada minuto do seu dia seja altamente produtivo, as obrigações que temos com a vida em sociedade e como tudo isso é ignorado, por mais que exista um peso de cobrança. eu não quero ficar detalhando todas estas ansiedades, pense nas suas aí.
cansaço, cansaço dessa vida moderna e acelerada. um cansaço que me lembra das sensações que senti quando tive um burnout. um desespero de estar tendo que dar conta de muitas coisas ao mesmo tempo, a solidão, a dificuldade de pedir ajuda, o medo de sobrecarregar quem me ajuda, a sensação de fracasso, atraso, incompetência, afinal, a grama da rede social do vizinho é muito mais verde, por mais falsa que ela seja.
em algum corte que vi de algum filme do studio ghibli falava o seguinte: “você pode escolher ser quem você quiser, a questão é o peso de trilhar sozinho um caminho que ninguém ainda fez”.
eu não vivo sob o ritmo acelerado que nos é imposto. eu faço tudo dentro do meu passo, porque eu sei que se tentar fazer diferente, algo ruim vai acontecer, seja fisicamente ou emocionalmente. parece meio paranóico, tipo toc, que se não fizer uma ação repetida alguma vezes, o mundo acaba. não é isso, é só que todas as vezes que fui obrigada a acelerar, entrei em crise, se algo precisava ser feito rápido, mesmo com cautela, acabei machucando meu corpo. eu sou lenta e lenta sempre serei.
não sou lenta, é o meu ritmo, porém, quando a gente coloca em comparação com um mundo que quer tudo para ontem, acabo sendo isto, lenta. e sou assim sozinha, porque é sempre um choque quando algumas pessoas descobrem meu jeito de vida.
um exemplo disso é eu ter uma casa sem TV, na qual a sala é composta por uma vitrola, muitos vinis, um sofá e muitos livros. é como se eu morasse no começo do século XX, como meu parceiro falava no começo da nossa relação. eu vivo em outro tempo, o meu tempo.
como foi dito na citação ali, trilhar seu próprio caminho, sem ser um caminho já percorrido, é carregar o peso de fazer tudo sozinha. independente de estar sozinha de fato ou não, a questão é que existe um peso de existência, de defender o que se acredita que, apesar de tudo, você carrega sozinha.
sou da filosofia que, se não for um problema de saúde, nada é para ontem. mas eu não posso falar isso no trabalho e é preciso ceder. se estou em alguma situação social, eu não vou ficar mexendo no celular, mas tenho que aceitar que todo mundo tem esse aparelho como uma extensão de si, assim, vão ter inúmeros momentos que estarei eu, sozinha, olhando o vazio esperando as pessoas checarem suas redes sociais. tenho que aceitar que toda minha vivência não é compartilhada e, sempre que falam de algo “que todo mundo viveu", eu só posso sorrir e fingir que essa experiência me contempla, mesmo quando eu não tenho a mínima noção do que estão falando.
então, já que é uma vida inteira lidando com esse sentimento de inadequação por ter uma vida tão lenta, faço aqui meu manifesto, na realidade um lembrete, para seguir esse caminho e, quem sabe, chegar ao sonho da casinha no campo, no meu caso acho que na praia mesmo.
um espaço em que eu possa escrever muitas cartinhas praianas, que eu fique do tamanho da paz, no silêncio, que eu possa colher todos os temperos, com filho de cuca legal, que tenha o tamanho ideal, que eu possa ter todos meus amores, meus discos e meus livros. que nada do que eu faça ali seja útil, mas que me faça feliz. que meu celular seja apenas para tirar fotos e nada mais. e que eu agradeça todos os dias por não ter cedido em momentos críticos a uma vida acelerada.
eu quero uma vida lenta, em que nada seja para ontem, em que nada seja produtivo, em que a existência não pese.
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